terça-feira, 30 de abril de 2013

Definição do nariz vermelho

Já é tradição que o nariz do palhaço é vermelho. Mas para se reafirmar as tradições e entender mais acerca do mundo, tem que se primeiramente questionar o “Por que” de tal tradição. Parafraseando Fernando Pessoa: “Primeiro estranha e depois entranha”.
Quem usa um nariz vermelho e nunca se questionou sobre a existência, a história e o simbolismo do mesmo, tem feito um uso vazio, despido de ciência.
Seria simplista escrever que vermelho pode indicar poder, sendo a cor dos cardeais, ou ainda indicar uma luta, ou a cor que junto com o verde forma a decoração de natal. Pode-se defender que vermelho remete a sangue, e por analogia à vida; ao sangue de Cristo para os religiosos. Isso se dá porque a cor vermelha pode ser associada a inúmeros sentidos: é a cor da paixão para os apaixonados. A cor da alegria para uns e da pureza para outros.
Mediante a tal reflexão é preciso que se aprofunde não só na análise da cor, mas a aspectos profundos, pois o nariz vermelho do palhaço pode ser considerado um arquétipo.
Arquétipo, palavra de origem grega grafada: aρχή – arché, que significa principal ou princípio, remete ao primeiro modelo de alguma coisa. A palavra foi adotada pelo psiquiatra suíço Carl Gustav Jung indicando a forma imaterial à qual os fenômenos psíquicos tendem a se moldar, refere-se aos modelos inatos que são matriz para os fenômenos da psique. Ou seja, são tendências estruturais invisíveis dos símbolos, são representações, imagens que correspondem a alguns aspectos da situação consciente do sujeito. Possui como sinônimo a expressão “imagens primordiais”. Segundo Jung se originam da constante repetição de uma mesma experiência no decorrer de inúmeras gerações.
O termo refere-se, portanto aos símbolos presentes no inconsciente coletivo. O inconsciente coletivo é a consolidação da experiência ancestral da espécie, sendo formado pelo material psíquico. Uma analogia facilita a compreensão: o inconsciente coletivo é como o ar, que é o mesmo em essência em todo lugar, é respirado por todos e não pertence a ninguém. O conteúdo que forma o inconsciente coletivo são os arquétipos que funcionam como peças do quebra-cabeça que o inconsciente coletivo é.
A personificação da figura mítica seja ela o palhaço ou um herói é algo que acompanha a humanidade e tem um significado que vai além do plano real da existência e consolida o inconsciente coletivo e se insere no tempo e na história. A forma de pensamento universal possui não só a carga estética, mas também uma carga afetiva sobre a imagem, sobre o símbolo.
Assim tratar do nariz vermelho do palhaço implica em evocar todo o significado que o gerou. Associa-se assim a força da forma com a força da cor.
Quanto à forma, o nariz do palhaço, consiste em uma bola redonda, um círculo. O círculo remete ao ponto, muitos palhaços pintam só um ponto vermelho como nariz, e pode ser considerado como sinal supremo de perfeição, união e plenitude. O centro que encontra motivo na própria existência.
O nariz podia ser verde, rosa, laranja. Mas, só de imaginar o nariz de palhaço dessa cor tem-se estranheza, pois se estruturou no inconsciente coletivo que o nariz do palhaço é vermelho.
Na grande maioria das civilizações, em sua simbologia, o vermelho significa força, virilidade, feminilidade, dinamismo. É uma cor exaltante e até enervante. Impõe-se sem discrição. É uma cor essencialmente quente, transbordante de vida e de agitação.
Na arte e na antropologia, o simbolismo da cor refere-se ao uso da cor como um símbolo em todas as culturas e religiões, enquanto a psicologia da cor remete à análise do efeito da cor no comportamento e sentimento humano, distinta da fototerapia (o uso da luz ultravioleta para curar a icterícia infantil). É importante não confundir psicologia da cor com simbolismo da cor. Mesmo apesar do fato de o simbolismo da cor possuir um caráter psíquico.
O vermelho, do latim vermillus, é a cor do sangue, situado no limite do visível do espectro luminoso. Abaixo deste comprimento de ondas, o infravermelho, não é mais perceptível pela visão humana. Também é conhecida como escarlate ou encarnado. É cor-luz primária e cor-pigmento secundária, resultante da mistura de amarelo e magenta.
Evoca padrões de memória que se relacionam a cor do coração, ao fogo, ao sol, ao rubi, a lava quente dos vulcões, a revolução.
Analisando a cor vermelha no âmbito do nariz do palhaço por intermédio da sentença: “O nariz do palhaço representa os olhos, e os olhos representam a alma.” Pode-se concluir que o nariz do palhaço é vermelho para chamar atenção do público por ser uma cor quente.
Serve como indicador da direção na qual o mesmo vira o rosto: o palhaço nunca movimenta o olhar, sempre move a cabeça em direção ao que observa o que por si só já consegue extrair risos.
Assim sendo, os olhos do palhaço tem de ser expressivos, tem que transmitir sentimentos, pois não precisam servir para indicar o que o palhaço olha. Não são portas de saída, mas de entrada, e dá acesso a alma do artista. Estabelece a relação palhaço – público, palhaço – outro. Permite que o sentir seja expresso pela forma e direção do olhar.
Os narizes são vermelhos porque zombam das ditaduras do ontem e do hoje, porque indicam que apesar da dor e sofrimento a vida continua, continua no centro do rosto, continua quente como o sol, continua apontando a direção na qual olhamos para lançar nossas almas nesse misterioso oceano a que chamamos vida.

Fonte: Mayra Lopes
LD